terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Quem dera

Quem dera chegasse
e se desarmasse.
Se despisse
e até chorasse.
Quem dera se permitisse,
se libertasse.
Sem medo, sem angústia nem dor.

Mas não.
Sem dó ou piedade
se vai, se arma, se veste, se prende,
se esconde.
Cada vez mais
se amarra
aos ais.

Tenta fugir, mas não sai de si.
Encontra-se preso,
num corpo estranho
que teme explorar.
Tem medo do mar
e de amar.

Mantém-se distante,
olha só de longe.
Admira, se encanta,
mas nem pensa em entrar.
Quem entra se molha,
se coloca à mercê da vontade das águas.
Ele não pode, é fogo:

Chama acesa que controla a si mesma.

Amaromar?
Só no sonhar,
só bem de longe,
só pra guardar
no olhar.










Voz

Chega de leve.
Como o suave bater de asas
de pássaros que enfeitam o pôr do sol
trazendo o entardecer.
E livre,
me leva.
Parece paz.
Parece guardar um mundo inteiro:
Sagrado, intocado,
dentro do peito.

Leve.
Tão leve.
Revela e releva.
Parece voz.
Flutua.
Entra pelos ouvidos alheios
e faz morada no coração dos desavisados.

Voz sim, a tua.
Que por penetrar no mais fundo do meu ser
já me pertence.
Nossa voz,
sai de ti
e afunda em mim.
Se apossa, me toma por inteiro.
Me consome,
e me transforma.

Vivo voz.
Viro a voz.
Essa que sempre nua e crua
é tão minhatua,
tão cheia
de nós.